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terça-feira, 14 de junho de 2022

Nossa 'pobre' burguesia e o déficit liberal

O lumpen*  empresariado

Considerações sobre as eleições de 2022 e o ileberalismo dos librais brasileiro

Artigo de Leonardo Avritzer (A Terra é redonda)

O episódio envolvendo o cancelamento pela corretora XP, um dos maiores players do mercado financeiro no Brasil, da publicação de uma pesquisa eleitoral que apontava a consolidação da liderança do ex-presidente Lula nas eleições desse ano, nos faz voltar a um tema que está no ar desde que o mercado aderiu, entusiasmadamente em 2018, à candidatura Jair Bolsonaro, um candidato que não era democrático e nem ao menos liberal. Sabemos hoje que as inclinações antigas do ex-capitão conseguiram prevalecer em relação ao suposto representante do liberalismo no governo, o ministro Paulo Guedes, que não passa de um liberal típico latinoamericano, aquele que confunde liberalismo com privatismo e conservadorismo com autoritarismo.


Uma parte da nossa imprensa – decepcionada não com as atitudes autoritárias do presidente ou com os seus ataques à democracia, mas com o seu comportamento errático na economia – adotou um rótulo que está na moda na Europa e começou a chamar o ex-capitão de presidente iliberal. Vale a pena enumerar o conjunto de equívocos presentes nesse rótulo. O primeiro deles deve-se ao fato de o conceito ou pseudoconceito ter sido usado pela primeira vez pelo primeiro-ministro da Hungria, Victor Orban, em um discurso em uma universidade húngara no verão de 2014.[1] Ali, ele afirmou “que a nação húngara não constitui uma simples soma de indivíduos, mas uma comunidade, reforçada e desenvolvida, e nesse sentido o novo estado que estamos construindo é um estado iliberal”.[2]


É raro, mas não impossível, a apropriação de um conceito com um significado inverso ao pretendido pelo autor, mas foi o que ocorreu com a ampla apropriação do conceito de estado iliberal, ou iliberalismo, na América Latina. Cabe nos perguntarmos por que. Tenho uma resposta que remete à censura da pesquisa Ipespe pela XP, que se disse pressionada por grandes investidores do agronegócio. Atos ainda mais questionáveis – tais como o apoio generalizado dos atores econômicos no pós-impeachment a um programa que não havia sido eleito nas urnas e, mais recentemente, o apoio do mercado a uma política de equiparação dos preços do petróleo aos preços internacionais –, sob o argumento da manutenção das reformas liberais (sic), complementam os traços da atitude do empresariado brasileiro na conjuntura nacional. Irei elaborar cada um dos elementos a seguir (continue a leitura).


(*) Lunpen: o conceito designa uma categoria social identificada pelo marxismo como um conjunto localizado abaixo do proletariado em condições de vida bastante precárias razão, possivelmente, para seu distanciamento político e ideológico  em relação com os trabalhadores organizados. No sentido aplicado por Avritzer em seu artigo, o termo lunpen parece definir o descompromisso da burguesia brasileira com os pressupostos doutrinários que diz defender. O pensamento liberal por aqui não é mais do que um eufemismo para proteger priviégios no âmbito de soluções políticas de caráter autoritário (leia na Wikipedia).


Leia também: * Para psicanalista, Bolsonaro tem mente paranoide e agrega em torno de si o pior do Brasil (entrevista com Christian Dunker na RBA)

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